Regina Maria de Souza

"Os Estudos Surdos têm surgido nos movimentos surdos organizados e no meio da intelectualidade
influenciada pela perspectiva teórica dos Estudos Culturais,
ou seja, os Estudos Surdos inscrevem-se como uma das ramificações dos Estudos Culturais,
pois enfatizam as questões das culturas,
das práticas discursivas, das diferenças e das lutas por poderes e saberes. 

Os Estudos Surdos se lançam na luta contra a interpretação da surdez como deficiência,
contra a visão da pessoa surda enquanto indivíduo deficiente,
doente e sofredor, e, contra a definição da surdez enquanto experiência de uma falta.
Os surdos - enquanto grupo organizado culturalmente -, não se definem como “deficientes auditivos”,
para eles o mais importante não é frisar a atenção sobre a falta/deficiência da audição
 - os surdos se definem de forma cultural e lingüística" 
(Wrigley, 1996, p. 12).

 

PROJETOS

Versos e anversos da discriminação – racismo e práticas sociais

O presente projeto tem como objetivo investigar a construção do racismo como positividade, isto é, como objeto de discurso das ciências da vida, e o modo como tal produção discursiva se entrelaça, legitima e confere materialidade às iniciativas sociais, em especial, às práticas escolares voltadas à inclusão dos diferentes. O racismo é entendido, na presente pesquisa, de um modo amplo, portanto, que não se restringe à etnia, mas às formas de dizer e de lidar com as diferenças de maneira a submetê-las a um duplo jogo: o da exclusão e o da inclusão permanentes, a partir de um quadro de referências que inventa, identifica, situa, classifica e hierarquiza o que não se enquadra nos padrões assumidos como “normalidade”. A abordagem adotada será tanto genealógica – no exame das práticas discursivas e não discursivas de produção das identidades “anormais” – quanto arqueológica, na medida em que se voltará à identificação dos enunciados que conferem solo epistemológico de possibilidade para a emergência dessas mesmas práticas. A discussão dos dados terá como principal referencial as idéias de Michel Foucault em tensão com aquelas defendidas pela psicanálise.

Eixo de investigação: O presente projeto agrega pesquisas (mestrados, doutorados, iniciação científica etc) que priorizam o aprofundamento do diálogo entre a Filosofia (em especial com as idéias de Foucault, Nietzsche e Deleuze) e a Psicanálise, visando contribuir com os estudos sobre a inclusão e a exclusão social e/ou escolar.
 

Fracasso escolar: o discurso do sujeito que não aprende na escola
Francisca Paula Toledo Monteiro - mestrado

O interesse por esse tema deu-se pelo desejo que senti de conhecer novos caminhos/olhares teóricos (e alargar aqueles já conhecidos) sobre possibilidades outras de aprender em instituições não escolares.
O que direcionou a formulação desse projeto foi a necessidade de refletir sobre minhas práticas como professora alfabetizadora, inconformada com a exclusão das crianças que “fracassam” na escola e que, fora dela, sofrem as penalidades impostas por uma sociedade grafocêntrica e excludente.
Situações da vida profissional me trouxeram para Campinas e uma nova realidade de trabalho me foi aberta: a de atuar em um espaço de educação não-formal que, no entanto, parece reproduzir a dinâmica da escola através de um conjunto de práticas e discursos sobre a criança que recebe no contra turno do tempo escolar. A pergunta principal que norteará o presente estudo será a seguinte: Haverá, nesse espaço dito não-formal, possibilidades para que eu invente novas formas de aprender-ensinar e de aprender com essas crianças?
Pretendo percorrer esse caminho através dos escritos de Michel Foucault. O objetivo do presente estudo, pois, é verificar as possibilidades de invenção e transformação do cotidiano dessas crianças em um espaço que, embora se inscreva no campo da educação não formal, acaba por reproduzir – na configuração da arquitetura, das atividades programadas para as crianças, nos usos e distribuição do tempo e dos espaços, entre outros – a estrutura e a dinâmica de uma educação escolarizada e formal.

Memórias da escola: resignificações do fracasso escolar
Lilian Cristine Ribeiro Nascimento - doutorado

O objetivo deste trabalho é verificar, a partir de relatos orais de pais de crianças com dificuldades de aprendizagem escolar, como os pais formulam os elementos de repetição da própria infância na infância de seus filhos. Busco investigar se diferenças na forma de conceber o sucesso/fracasso social e profissional em suas vidas atuais influenciam o modo como estes adultos compreendem as dificuldades vivenciadas pelos filhos, bem como (re)significam sua própria trajetória na escola.
De fato, no trabalho clínico que realizo com crianças com “distúrbios de aprendizagem”, é muito freqüente que um dos pais (ou o pai ou a mãe) encontre semelhanças com as dificuldades apresentadas pelo filho(a) e se identifique com o sofrimento vivido por ele(a). Fazem isto fazendo retornar à memória – nas conversas que têm comigo - sua própria vida escolar, os dissabores sentidos e as formas encontradas de lidar com elas.
Será objeto do presente estudo, portanto, analisar as narrativas destes sujeitos, pais ou mães de crianças encaminhadas pelas escolas para a clínica fonoaudiológica, por apresentarem dificuldades de aprender, e que vivenciaram também eles uma história semelhante em sua infância.
As ferramentas que serão empregadas serão aquelas da Análise do Discurso Francesa, baseada nos pressupostos teóricos de Michel Pêcheux. Para uma discussão global, serão convocadas contribuições da Psicanálise e da Filosofia, em especial, aquelas de Freud e Foucault.

Os processos de subjetivação de jovens mediados pelos percursos na cidadania
Maria Teresa de Arruda Campos - mestrado

O presente projeto parte dos pré-construídos sobre a adolescência, em especial, aqueles engendrados pelos discursos da educação e da psicologia. Em nosso cotidiano, nas mais variadas formas de comunicação (TV, rádio, revistas etc) bem como nas conversas que ocorrem nos mais distintos contextos (sala de professores, restaurantes, em nossas próprias casas etc) comumente à “adolescência” se associam expressões como “revolta”, “irresponsabilidade”, “instabilidade de humor” e “delinqüência”; palavras essas também impressas em manuais de pedagogia, de psicologia e de medicina que, ao “patologizarem” o adolescente, o transformam em “o” problema da/para a sociedade, da/para a escola e dos/para os pais.
A adolescência passa, assim, a ser uma vala comum onde se alocam identidades múltiplas, transformadas em abstração pelos discursos que fabricam o sujeito epistêmico adolescente. Tal pasteurização identitária é atualizada no comentário “adolescente é tudo igual, só muda de endereço” - tão difundido por pais, professores, comunicólogos, profissionais e até pelos próprios adolescentes.
No rastro de tais idéias, este trabalho tem como objetivo ouvir adolescentes que se recusam a serem enquadrados nas definições que foram criadas para eles. Dito de outro modo, são objetivos da presente pesquisa problematizar os conceitos de adolescência - advindos do discurso psicopedagógico, do conceito de protagonismo juvenil, de voluntariado e de resiliência - e suas relações com as invenções mediadas pelos discursos que as constituem, realizando uma cartografia dos espaços de participação social desses “outros” adolescentes e jovens que resistem se conformar a esses conceitos.

Jacques Lacan, o passador de Georges Politzer: surrealismo e psicanálise
Márcio Aparecido Mariguela - doutorado

O presente projeto foi aprovado em exame de qualificação em abril do presente ano (2005), tendo como objetivo investigar a presença do ensaio de Politzer, Crítica dos Fundamentos da Psicologia: a psicologia e a psicanálise, publicado em 1928, na tese de tese de doutorado em psiquiatria de Lacan, Da psicose paranóica em suas relações com a personalidade, publicado em 1932. Tal presença brilha por sua ausência: o nome de Politzer não é citado nenhuma vez e, a despeito disso, a letra politzeriana está contida na construção do caso clínico Aimée.
Para estabelecer a relação entre Lacan e Politzer utilizo, como ferramenta, os argumentos de Michel Foucault sobre a função autor. Em sua leitura de Freud, Politzer criou as condições para que Lacan pudesse conceber a diferença como produção de subjetividade, pois o drama de Aimée é analisado como estruturante de sua personalidade.
Para demonstrar que a função autor se exerce na instauração de discursividade, demarco um cenário histórico específico e assim realizo uma análise genealógica das produções históricas das diferenças. A perspectiva do trabalho de leitura dos textos aqui recortados é demonstrar que o movimento surrealista abriu as fronteiras para que a recepção da obra de Freud pudesse adquirir consistência teórica e prática num espaço cultural que até década de 1920 permaneceu refratário à psicanálise. Concluo indicando que Lacan foi o passador de Politzer por ter instaurado uma prática clínica por descontinuidade com a concepção ontológica de inconsciente.

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